A formação do cânon literário.
Inicialmente a linguagem é uma forma de relação não injetora entre o real e o simbólico no qual um termo ou uma expressão visa representar uma situação na qual a interpretação depende das bases culturais do receptor. Desta maneira a cultura ocidental entende que dominar a linguagem é uma forma de poder e de imposição social sobre os que a não dominam. Para entender o conceito de cânon é relevante esta observação pois a escolha de um cânon literário é uma forma de formalizar um conjunto de obras que ratificam, justificam e impõe o poder social e cultural. Um texto contém dentro dele toda a experiência de outros textos e toda a relação com os significados de uma cultura e um tempo.
Na Grécia “Kanon” representava uma vara de medição e derivou para as línguas latinas com o sentido de norma ou lei. A primeira visão de canonização (mesma palavra aliás para definir que são os santos na religião católica) vem dos princípios do cristianismo quando escolheu-se quais textos fariam parte e quais textos não fariam da Bíblia, isto demonstra uma imposição de autoridade e de poder da igreja procurando quais verdades lhe interessavam. Na visão artística literária, o cânon representa um conjunto de obras consideradas obras-primas com um valor fundamentas para o patrimônio da humanidade e que deve ser conhecida pelas gerações futuras. Estes clássicos seriam incontestáveis e referência para a cultura universal (ou ocidental), mas qual seriam os critérios para inclusão ou exclusão de um texto nesta lista?
Uma possível explicação pela inclusão do uma obra no cânone esta relacionada com a estética, estimando o valor do texto que contém uma beleza literária, sem considerar valores externos. Esta é uma noção é ideológica e elitista mostrando mais uma vez a relação de qualidade como a relação de poder. Esta idéia inicia-se no final do século XIII e início do XIX, com a idéia de que esta suprema beleza rivaliza com as mazelas do capitalismo. Posteriormente, as universidades realizam esta tarefa de estratificação cultural elegendo as grandes obras a serem estudadas. Esta visão contem uma transmissão cultural da obra que exclui algumas extratificações sociais que exclui algumas camadas da sociedade, não incluindo neste cânone mulheres, africanos ou indígenas e aproximando a qualidade do homem, branco e europeu ( ou do WASP norte americano). È recente a inclusão de algumas mulheres, alguns latinos e alguns negros como autores de qualidade, ou seja , o ato de ler é um ato também político.
A composição do cânone brasileiro se inicia com um forte nacionalismo dos românticos, nacionalismo este que procura os valores da terra mas não perde a influência do ideais europeus, principalmente franceses. No final do século XIX, onde a cultura era extremamente elitista, até porque poucos eram as pessoas que possuíam livros e sabiam ler, temos a influência de dois críticos relativamente opostos que são Silvio Romero, valorizando mais a visão social e José Verissimo, valorizando mais o estilo e a forma do texto. Este mesmo entrave segue no século posterior com duas vertentes distintas, onde Afrânio Coutinho, em Conceito de literatura brasileira analisa mais a estilística, no modelo do “new cristicism” norte-americano e Antônio Cândido, de formação sociológica, na Formação da literatura brasileira, valoriza a relação da obra com o social.
Pode-se concluir então que alem de subjetiva e pessoal, a formação de um cânone literário é também social e política, divergindo de crítico para crítico, com critérios de inclusão e exclusão muito variantes.
domingo, 24 de outubro de 2010
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