domingo, 24 de outubro de 2010

O que é Literatura?

Antes de qualquer discussão, literatura é arte. Mas o que é arte? A arte apresenta vários conceitos. O mais consagrado é o de Aristóteles: “Arte é mimese” (espelho da vida, imitação da natureza, imitação da realidade a fim de buscar a perfeição ou o belo). Provavelmente não conseguiremos chegar a uma definição exata, delimitando seus contornos com o não artístico, do que é arte e provavelmente do que é literatura. Da mesma maneira, se algum dia você se perguntar o que é música, vai se deparar com o mesmo dilema, mas certamente a literatura, o teatro, a música são subconjuntos de um conjunto mais chamado arte. Literatura como entendemos pode ser o conjunto de obras escritas, ou mais especificamente a composição de obras de arte em que a palavra é a matéria-prima. Logo a literatura é a arte de escrever. A linguagem literária pode ser diferente da usada na comunicação diária. É uma linguagem que se preocupa mais com o aspecto estético, usa muito a conotação e a função poética, palavras que ganhem novos significados, portanto pode requer muito trabalho estético do autor.
Para José Luis Jobim, em seu texto História da Literatura, O conceito do que é uma obra literária tem suas bifurcações. Pode-se pensar que qualquer texto escrito e, as vezes, até um expressão não verbal pode ser literatura. Pode-se pensar, como imaginavam os formalistas russos, que a obra literária possui uma propriedade comum às obras literárias chamada literariedade ou, como Roman Jakobson, como aquilo que faz uma mensagem verbal uma obra de arte. A própria definição exata dos períodos literários e dos estilos de época são perigosas ou, no mínimo, subjetivas, dependendo de quem, onde e principalmente quando esta definição está sendo feita. A organização e classificação das obras literária é muito mais subjetiva que a própria obra. Quando um autor escreve, vários leitores o interpretaram de diversas maneiras.
Terry Eagleton, em seu livro Teoria da Literatura: uma introdução afirma: “Se a teoria literária existe, parece óbvio que haja alguma coisa chamada literatura, sobre o qual se teoriza.” Porem, prosseguindo no texto, e fazendo possíveis definições do tema, encontra para cada uma delas problemas e falhas em suas enunciações. Uma possível distinção inicial entre o literário e o não literário poderia estar na discriminação entre o fato e a ficção. Porém, podemos encontrar textos medievais e novelas de cavalaria onde algumas são ficções e outras revelam tentativas de relatar episódios reais reais. Esta distinção pode acontecer até no livro mais publicado e polêmico de todos os tempos: O Evangelho, ou A Bíblia que para alguns, transformar água em vinho, ressuscitar e uma mãe ter um filho sem manter relações sexuais são fatos reais, para outros, pura ficção. (Ainda bem que Gabriel Garcia Marques não nasceu há dois mil anos em Jerusalém e se tornou apóstolo, a neurose místico-evangélica-cristã seria surreal). Assim como a distinção entre o fato real e a ficção imaginativa atormentam as bases da religião, ela também se confronta na ciência. Poucos escritores literariamente consagrados conseguiram ser tão criativos e imaginativos com Einstein em sua teoria da relatividade geral e restrita: velocidade da luz não depender de referencial, espaço contrair, tempo dilatar e massa se relacionar com energia são tão fantásticos que a própria comunidade científica da época não entendeu com realidade.
Sobre os formalistas russo do início do século XX, Terry Eagleton também comenta sobre as valorizações das formas do texto, de seu estilo. Críticos militantes, engajados e políticos, opõem-se ao misticismo simbolista da crítica literária até o momento, propondo um caráter científico à análise do texto. Procura-se a verificação das estruturas da linguagem aplicando os conceitos lingüísticos em oposição ao conteúdo da mensagem. A obra literária é constituída de artifícios, figuras de linguagem que englobam som, imagem, ritmo, rima, métrica, técnicas e narrativas que provocam uma surpresa e um estranhamento no leitor, diferenciando o texto literário do texto comum. Nos desenvolvimento das narrativas os formalistas valorizavam os desvios, como os entraves e retardamentos provocando uma violência lingüística com diferencias, com originalidade. Mais uma vez, a tentativa de definição de literatura encontra limites não definidos; uma frase, pela definição dos formalistas pode ou não ser reconhecida como literária dependendo da aplicação de seu contexto. Podemos encontrar frases simples em grandes obras literárias e até excelentes poemas que contem frases simples e coloquiais mas que formam idéias geniais e de grande valor. Para esta visão os poemas: Poema tirado de uma notícia de jornal ou Pneumotórax de Manuel Bandeira ou até mesmo o Erro de português de Oswald de Andrade não teriam valores formais e literariedade suficientes para serem considerados arte.
Pode-se então pensar que qualquer forma de expressão é literatura, mas aí esbarra-se em discussões como saber se um texto histórico, um texto filosófico, uma tese científica ou até uma bula de remédio contém caráter literário ou não. Mais uma vez encontramos possíveis interpretações dos valores. O valor é subjetivo. Assim como a palavra comida pode se referir a tudo com que uma pessoa pode se alimentar, cada um vai ter seu gosto pessoal por alimentos que mais o satisfazem. Na literatura também temos isto, a literatura contem um conjunto gigantesco de obras que não há alguém que possa ter acesso a todas para definir o que pertence ao seu cânone ou não. Assim também não há duas pessoas que leram exatamente as mesmas obras. A literatura pode ser um DNA da alma, assim como cada corpo físico tem o seu DNA único, aleatório e individual, a literatura de cada um é também pessoal e única, criando dificuldades na elaboração de uma única resposta para a seguinte pergunta: O que é Literatura?

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